Quanta morte há em viver

O desejo de morte é algo estranho. Estranho porque é contraditório. Ou não. Meu desejo de morte vai de encontro à vida que quero viver. E quero viver.

Talvez esse seja o problema: Não quero viver uma vida. São milhares as vidas que quero viver. São diversas as formas que me imagino vivendo, os dias que me imagino levando, as vontades que me imagino concretizando. E daí vem o desejo de morte.

Porque são tantas as formas, as possibilidades que sei que não atingirei. Todos esses conteúdos que eu gostaria de incluir na minha vida. Tantos diferentes horários, modos, lugares em que eu gostaria de acordar não cabem no meu cotidiano. Não cabem em todos os meus anos os dias que eu gostaria de levar.

Não cabe em mim essa vontade de ser tanta. De ser tão mais eu. De ser todas dentro de mim.

Meu universo não cabe no mundo.

E aí vem o desejo de morte.

Como quem olha uma lua no céu e outra no mar. Ismália enlouquecida entre a sua própria realidade e a vida. Entre todas as vidas que sonha buscar e sabe que jamais atingirá. Sempre entre dois, três, quatro ou milhares de planos tão distantes um do outro e simultaneamente perto. Dentro. Coexistindo debaixo de uma só pele. Em um só ser.

E em cada vida que levo mato outra em mim. Desfazendo-me de meus pedaços. Tornando-me menor.

Porque uma vida tão grande assim só pode caber na morte.